Vice-presidente da Fedex América Latina, a advogada Marilyn Blanco-Reyes garante que a experiência internacional é válida desde que baseada na proficiência profissional
Texto: Marcela Rossetto, Visão Jurídica
A advogada Marilyn Blanco-Reyes é vice-presidente de Assuntos
Legais e Regulatórios para a Divisão da América Latina e Caribe da FedEx Express (maior e mais antiga empresa de transporte e logística Express do mundo, com operações em mais de 220 países). Cubanoamericana e autointitulada “brasileira de coração” em razão do contato próximo com o Brasil desde o começo da carreira, trabalhando e morando no País.
Poliglota e multicultural, Marylin, com 16 anos de FedEx, está sempre envolvida em temas jurídicos que buscam melhorar o acesso da America Latina a produtos, serviços e ideias inovadoras.
Nesta entrevista concedida à Visão Jurídica por e-mail, Marylin comenta o mercado jurídico internacional e dá boas ideias e sugestões para advogados interessados em atuar fora do país.
VJ – Qual o papel do advogado e/ou departamento jurídico no sucesso de um empreendimento no mercado internacional, especificamente na América Latina?
Marilyn Blanco-Reyes – Naturalmente o trabalho cotidiano de um departamento legal é similar tanto em uma companhia multinacional quanto em uma empresa local. Você precisa ser capaz de elaborar e analisar contratos, liderar negociações, prestar consultoria em questões trabalhistas, cíveis, comerciais, tributárias, fiscais, regulatórias, e também analisar e gerenciar as demandas contra e a favor da empresa etc. Essa é a base do trabalho de um advogado/ departamento legal em qualquer lugar – é universal. Ao trabalhar no âmbito internacional, particularmente como advogada de uma empresa multinacional, eu acredito que o maior desafio seja encontrar o equilíbrio entre as preocupações e considerações da matriz no exterior e as práticas locais. Nesse sentido, para mim, uma das funções-chave do meu trabalho é garantir que as filiais e subsidiárias estrangeiras da empresa estejam agindo em conformidade com as leis e costumes locais, ao mesmo tempo em que mantêm a cultura corporativa da matriz, e observando o regime jurídico desta. Posso dizer por experiência própria que esse equilíbrio é muito delicado.
VJ – Como a senhora vê o mercado de trabalho para o advogado que atua em Direito Empresarial na América Latina?
MBR – Eu acredito que este é um excelente momento para ser um advogado na América Latina e no Caribe, particularmente para um advogado que tenha experiência internacional e conhecimento de línguas estrangeiras. A demanda por bons advogados aumenta na mesma medida em que a economia dos países emergentes cresce. Seja para uma empresa local levando seus produtos/serviços para o mercado global, seja para uma empresa estrangeira fazendo investimentos em um novo mercado – há muitas oportunidades para que os advogados prestem seus serviços.
VJ – Que perfil profissional deve ter o advogado que pretende atuar no mercado empresarial internacional?
MBR – Embora eu tenha conhecido diversos advogados excelentes que não possuem diploma estrangeiro, de graduação ou de pós-graduação, eu diria que os mais bem-sucedidos hoje são os que dedicaram tempo para estudar no exterior e/ ou adquirir experiência de trabalho em outros sistemas jurídicos. Contudo os advogados que atuam no cenário internacional devem, acima de tudo, ser absolutamente proficientes em sua área de conhecimento em seu país de origem – eles têm que ter uma base de conhecimento à qual adicionem a experiência internacional. Sem essa base, experiência internacional e domínio de língua estrangeira são apenas um embrulho bonito em uma embalagem vazia.
VJ – O domínio do inglês já é considerado básico para qualquer profissional que queira atuar em grandes negócios. Qual a segunda língua estrangeira do momento? O espanhol ou o chinês/mandarim? Por quê?
MBR – A proficiência em uma língua estrangeira é uma ferramenta indispensável para os advogados hoje. Concordo que o inglês é a língua universal dos negócios, e assim será por muito tempo. No contexto da América Latina e Caribe, é claro que o espanhol é essencial, mas, francamente, os brasileiros e usuários da língua portuguesa podem ser capazes de lidar bem com o espanhol sem muito treinamento formal. Dadas as oportunidades na China, o meu conselho para os jovens advogados seria estudar chinês/mandarim, além do inglês.
VJ – Ao longo de sua experiência no mercado internacional, a senhora certamente se deparou com profissionais do Direito saídos das mais diversas universidades. Como a senhora avalia a formação dos estudantes na América Latina – mais precisamente no Brasil?
MBR – Ao longo da minha carreira, que começou há 22 anos em São Paulo, tive o privilégio de trabalhar principalmente com advogados da América Latina e tenho um grande respeito por suas habilidades e ética de trabalho. Estive envolvida em diversas negociações internacionais e constatei, em primeira mão, as sofisticadas habilidades de negociação e de elaboração de documentos dos meus colegas latino-americanos. Existem diversas faculdades de Direito excelentes no Brasil, formando advogados “super stars” que causam um grande impacto na comunidade jurídica. Quanto à formação jurídica por si só, eu confesso que ainda tenho preferência pelo estilo norte-americano de educação legal. A própria estrutura (a escola de Direito é um curso específico e intenso de três anos que se pode fazer somente após já se ter cursado e concluído quatro anos de graduação) e o rigor da disciplina acabam sendo uma vantagem para os advogados formados nos EUA. Em conversas com muitos advogados da América Latina que obtiveram os seus Juris Doctor (diploma de Direito) e/ou LLM (mestrado em Direito) nos EUA, eu ouvi muitas vezes o quão mais difícil eles acharam o curso nos EUA que os cursos em seus países de origem.
VJ – Em várias faculdades brasileiras, no curso de Direito, a disciplina Direito Internacional ainda é opcional. Qual sua opinião a respeito disso?
MBR – Em um mundo cada vez mais globalizado e interdependente, não olhar para além das nossas fronteiras é uma atitude míope. É algo que eu prego a cada dia no meu relacionamento com os advogados dos EUA, para quem, francamente, as línguas e a formação estrangeiras são desafios também.
VJ – Há um crescente entendimento no Brasil de que os cursos de Direito estão formando “errado”, pois ainda estão focados na preparação do futuro profissional no litígio, e não na negociação. A senhora concorda? Atualmente, o advogado é mais um negociador?
MBR – Certamente a habilidade com os litígios é um elemento importante da formação jurídica. Muitas vezes, inclusive, eu recebi bons conselhos sobre redação de certas cláusulas contratuais de colegas mais dedicados a essa área, cujas experiências no tribunal produziram pérolas de sabedoria para o advogado mais ligado a negociações, como é o meu caso. No entanto, igualmente importante, particularmente no âmbito do advogado interno, é a capacidade de negociar contratos e acordos, bem como a resolução de conflitos, quando infelizmente eles acontecem.
VJ – Qual o seu conselho para os jovens advogados que pretendem exercer a advocacia no mercado empresarial internacional?
MBR – Eu começaria reforçando algumas das coisas que disse nas respostas anteriores. Em primeiro lugar, desenvolva a sua aptidão e o seu conhecimento legal em seu país de origem, de tal forma que você tenha algo substancial para oferecer. No início de sua carreira (mas não muito cedo), estude fora e aperfeiçoe suas habilidades em língua estrangeira. Trabalhe em outro país, em um escritório de advocacia ou em uma empresa, e experimente como é a advocacia lá. Finalmente, construa sua rede de contatos internacionais na profissão e no mundo dos negócios, assim clientes e/ ou ofertas de emprego não vão faltar.